IA impulsiona processos industriais e transforma o setor farmacêutico
Por Egle Leonardi
Os desafios da Indústria 4.0 são evidentes em todos os setores, mas, na indústria farmacêutica, a introdução da Inteligência Artificial (IA) nos processos industriais deve elevar o nível da produtividade e da segurança, além de otimizar o controle de qualidade e a eficiência. Com avanços como machine learning e Internet das Coisas (IoT), a IA tornou-se uma ferramenta fundamental na produção, na pesquisa e no desenvolvimento industrial.
“A IA desempenha um papel fundamental na otimização de processos e na tomada de decisões no setor farmacêutico, servindo como uma ferramenta de análise e automação baseada em dados”, ressalta o professor do CDPI Pharma, farmacêutico industrial e data scientist no GCB Tecnologia, Victor Cavalaro.
Ele explica que, com a IA, é possível ter um ‘assistente’ que pesquisa em múltiplas bases de dados – como USP, ICH, Anvisa e artigos científicos – para identificar novas descobertas, como uma nitrosamina, a atualização de normas com resumos comparativos ou até relatos de efeitos colaterais. Ela pode, inclusive, redigir documentos internos padronizados, incorporando resultados de validações de processos e análises nos laboratórios de P&D e CQ.
Além de personalizar processos, a IA permite que as decisões sejam realmente orientadas por dados, liberando o tempo dos profissionais para avaliar informações relevantes, sem se perder em etapas menores e repetitivas. Sua aplicação abrange desde novos insights para validação de processos até sugestões de ajustes que tornam a produção mais competitiva, assegurando margens de lucro e contribuindo para a acessibilidade de medicamentos ao paciente.
É fato que a indústria farmacêutica enfrenta desafios constantes para atender a uma demanda crescente por medicamentos e cumprir rigorosos padrões de qualidade e regulamentação. “A complexidade dos processos de produção exige ferramentas que reduzam erros e aumentem a eficiência. A IA vem como uma solução para a indústria, pois, permite a automação de etapas que antes dependiam exclusivamente das análises manuais”, comenta o CEO do CDPI Pharma e do Ephar Instituto Analítico, Poatã Casonato.
Desafios e perspectivas da IA no setor
Apesar dos avanços, existem desafios para a adoção plena da IA nos processos industriais. Um dos principais é o alto custo inicial de implementação e a necessidade de treinamento de mão de obra qualificada para operar essas novas tecnologias. Outro ponto crítico é a segurança cibernética: a automação aumenta a vulnerabilidade das empresas a ataques cibernéticos, o que exige sistemas de proteção robustos.
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No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) exige que empresas farmacêuticas sigam regulamentações rigorosas, o que pode dificultar a rápida adoção da IA. No entanto, os benefícios da IA são promissores e indicam que, com o tempo, possíveis barreiras tendam a diminuir.
Por outro lado, a própria Agência já tem adotado diversas estratégias de otimização de seus processos de trabalho. Dentre elas está a utilização de soluções tecnológicas, com a aplicação de modelos de inteligência artificial. A Anvisa acaba de divulgar uma ferramenta baseada em IA para otimizar a análise de estudos de qualificação dos limites de impurezas e produtos de degradação em medicamentos sintéticos, classificados como novos, inovadores, genéricos e similares.
Já Cavalaro elenca outros desafios importantes a serem considerados:
- Armazenamento e acesso massivo de dados: no contexto de machine learning, lidamos com volumes de dados em centenas de milhões; já para IA, estamos na escala de bilhões, frequentemente com integração a grandes modelos de linguagem (LLMs). Isso traz desafios ao compliance industrial, especialmente na gestão e segurança dos dados.
- Precisão e confiabilidade dos dados: um dos maiores desafios de compliance é garantir que os dados sejam precisos, atualizados e confiáveis. Dados incorretos podem resultar em modelos de IA com baixa precisão ou ‘alucinações’, o que compromete a integridade dos processos.
- Mudança de mindset: é necessário migrar do analógico para o full digital e adotar uma visão orientada a dados (data-driven). Isso implica pensar mais em termos estatísticos e entender como os dados impulsionam decisões estratégicas.
- Capacitação profissional: há uma escassez de profissionais qualificados na área, e muitos estão ainda nas universidades, com pouco contato com o setor industrial.
- Definição de perfis: cada profissional deve entender seu papel nesta transformação. Isso pode envolver o desenvolvimento de modelos (função semelhante a um engenheiro de software) ou o uso estratégico dos modelos para apoio à decisão, focando no direcionamento e aplicação dos resultados obtidos.
De fato, o que é a inteligência artificial
A inteligência artificial (IA) tem impulsionado grandes transformações ao redor do mundo atualmente. Contudo, ela representa apenas uma das vertentes de uma ciência mais ampla, que abrange desde recomendações de produtos e otimizações de desempenho em máquinas industriais, por meio de softwares com machine learning, até os grandes modelos de linguagem (LLMs), como o ChatGPT, e, mais recentemente, os agentes de IA.
“É comum que as pessoas usem os termos IA e machine learning (ML) de forma intercambiável, especialmente ao tratar de big data, análise preditiva e outros temas de transformação digital. Essa confusão é compreensível, pois IA e ML estão intimamente ligados; porém, essas tecnologias diferem em diversos aspectos, como escopo, aplicações e mais”, alerta Cavalaro.
A adoção de produtos de IA e ML está crescendo rapidamente, pois as empresas aproveitam essas tecnologias para processar e analisar grandes volumes de dados, melhorar a tomada de decisões, gerar recomendações e insights em tempo real, e produzir previsões com alta precisão. Segundo o especialista, isso é o que se chama de decisão baseada em dados, e vem da cultura de dados ou data-driven.
Definições básicas, porém fundamentais
Inteligência artificial (IA) – um campo amplo da tecnologia que busca desenvolver máquinas e computadores capazes de simular funções cognitivas humanas, como percepção visual, compreensão e resposta à linguagem, análise de dados, geração de recomendações e outras habilidades complexas.
Embora a inteligência artificial seja, muitas vezes, vista como um sistema completo, ela consiste em um conjunto de tecnologias integradas em um sistema para possibilitar que ele analise, aprenda e aja de forma autônoma na resolução de problemas complexos.
Machine learning – é uma área da inteligência artificial que permite que máquinas e sistemas aprendam e melhorem automaticamente a partir de experiências. Em vez de seguir instruções rígidas, o machine learning usa algoritmos para analisar grandes volumes de dados, extrair insights e tomar decisões.
Cavalaro, que é quem oferece todas essas definições, também afirma que os algoritmos de machine learning aprimoram o desempenho com o tempo na medida em que são treinados com mais dados. Os modelos resultantes representam o aprendizado obtido ao processar esses dados. Quanto maior a quantidade de dados, melhor tende a ser o modelo.
Como a IA e o ML estão conectados
Segundo o farmacêutico especialista, a IA e o ML não são exatamente a mesma coisa, mas estão diretamente relacionados. A maneira mais simples de entender a relação entre IA e ML é:
- IA é o conceito mais amplo que envolve tornar uma máquina capaz de perceber, raciocinar, agir e se adaptar de forma semelhante ao ser humano.
- ML é uma aplicação dentro da IA, que permite que máquinas aprendam e extraiam conhecimento dos dados de forma autônoma, criando sugestões de produtos baseados no perfil de consumo, gerando moléculas de degradação com base em características físico-químicas ou novos medicamentos, com base em mecanismos SAR (structure activity relationship).
Qualificação em IA para os profissionais da indústria
“No setor industrial farmacêutico, a qualificação prepara os profissionais para operar em ambientes complexos e regulamentados, mantendo-os atualizados com práticas de qualidade e segurança. Em relação à IA, a qualificação tem o objetivo de capacitar os profissionais a compreender e aplicar técnicas de IA para otimizar processos, interpretar dados com precisão e tomar decisões baseadas em insights gerados por essas tecnologias”, comenta Cavalaro.
Isso inclui a habilidade de avaliar modelos, entender riscos de compliance e integridade de dados, e, sobretudo, integrar a IA de forma segura e ética nas operações. Profissionais qualificados em IA não apenas fortalecem a competitividade da empresa, mas também garantem que a implementação dessa tecnologia seja eficiente e alinhada às exigências regulatórias e de mercado.
“Por fim, uma provocação à nossa Anvisa, ao Governo Federal, à indústria e às universidades: temos uma oportunidade única de construir o maior banco de dados para o desenvolvimento de medicamentos genéricos e novos medicamentos, utilizando os dados dos estudos de bioequivalência dos medicamentos de referência. Esse banco poderia também incluir informações sobre efeitos colaterais e eventos adversos, acessíveis por meio de ferramentas seguras e sem a quebra de informações sigilar, respeitando o compliance e a LGPD, como aplicações APIs que fornecem apenas informações necessárias para o consumo dos modelos de IA”, defende ele.
Essa base de dados revolucionaria o desenvolvimento de genéricos e novos medicamentos, tornando-o mais rápidos, eficazes e seguros, reduzindo a necessidade ou a quantidade de testes em humanos, além de orientar o desenvolvimento de novas moléculas, mais seguras e eficazes, com uma abordagem nacional e, futuramente, global. “Mas alguém precisa dar o primeiro passo para liderar essa corrida tecnológica, e torço para que seja o Brasil, pois potencial humano nós temos”, dispara Cavalaro.
Entenda tudo sobre IA, com o CDPI
Para quem deseja se aprofundar nesse campo promissor e entender melhor como a tecnologia impacta a produção de medicamentos e produtos químicos, o Curso Superior de Tecnologia – Gestão da Produção Industrial, fornece uma base sólida e prepara profissionais para os desafios da Indústria 4.0.
Além disso, o CDPI oferece o Curso – Inteligência Artificial e Ciência de Dados na Indústria Farmacêutica, que tem como objetivo capacitar profissionais da área a utilizar a ciência de dados e a inteligência artificial para transformar dados brutos em insights valiosos e a aplicar essas tecnologias para otimizar processos, melhorar a qualidade dos produtos e serviços e impulsionar a inovação dentro da organização.
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